segunda-feira, setembro 26, 2005

O avanço do poder grisalho no mercado brasileiro

Não é preciso ir fundo nos dados demográficos para se constatar que o Brasil está envelhecendo. A geração que fez dos anos 60 um espaço de imaginação e contestação entra no novo milênio como representante de um novo poder, o "poder grisalho". Experientes e pragmáticos, eles se beneficiam atualmente de uma combinação de afluência material e avanço do conhecimento, jamais acessíveis a outras gerações. Como utilizarão isso em suas vidas pessoais e profissionais é a questão que aqui levanto. Antes, contudo, é importante percorrer o "background" deste cenário.
Hoje, os indivíduos com 60 ou mais anos de idade totalizam cerca de 15 milhões de pessoas, ou 9% da população brasileira, de acordo com os dados do IBGE. A tendência é de que esse número, pelo menos, dobre nos próximos 20 anos. Trata-se de uma mudança significativa na estrutura etária do país, se considerarmos que na década de 40 os "sessentões" representavam apenas 4% dos brasileiros. A perda de participação dos jovens no desenho demográfico foi motivada, em parte, pela redução dos índices de natalidade a partir dos anos 80, e pela diminuição da taxa de fertilidade com impacto no próprio tamanho das famílias brasileiras. As mulheres da década de 60, por exemplo, tinham em média 6,2 filhos, enquanto atualmente não passam de 2,3 - especialmente aquelas com nível elevado de instrução.
Outro fator está no aumento da expectativa de vida - um fenômeno mundial - que aqui no Brasil saltou de 46,3 para 71,3 anos de idade em menos de meio século. Resultado direto de um rápido processo de urbanização e da melhoria de serviços de primeira necessidade, como saúde e saneamento básico, e não propriamente do desenvolvimento social. Os avanços no campo da medicina, da nutrição e da própria tecnologia fizeram despontar indivíduos maduros com muito mais vigor, preparo e disposição para assumir os desafios que a sociedade moderna e o mercado de trabalho apresentam atualmente. Apesar de o culto à juventude ainda predominar no "show business", na moda e na publicidade, o poder grisalho vem ganhando seu espaço.
No Brasil, trata-se da geração "baby-boomers", indivíduos nascidos durante o pós-guerra - época que coincide com a volta dos soldados para casa e a explosão dos índices de natalidade. Hoje, estão na casa dos 60, mas aparentam lá seus 45 anos de idade - resultado do chamado "efeito dos 15 anos a menos", que acompanhou este processo de envelhecimento da população brasileira nas últimas décadas. São, em sua maioria, as pessoas que viveram em um ambiente marcado pela expansão do mercado de consumo de massa - a televisão foi seu maior ícone -, do acesso à cultura e à gestão do conhecimento.
É fato que a geração dos "baby-boomer" tem as melhores condições - em tese, por já ter vivido mais, criado sua família e obtido a tão sonhada independência financeira - de fazer o papel de mentores dentro do ambiente corporativo. São eles que, por meio da experiência, dão o tempero e o equilíbrio ideal que uma empresa formada por jovens executivos ambiciosos precisa. Sua contribuição para o amadurecimento das organizações brasileiras é indiscutível.
É por essa razão que a demografia guarda uma íntima relação com a qualidade do processo de 'mentoring' (transferência de aprendizado) nas empresas. Não são apenas profissionais mais vividos em posições de destaque, premiados por seus longos anos de entrega ao ofício. Trata-se de verdadeiros conselheiros, de quem se espera a nobre missão de liderar e partilhar o conhecimento com seus aprendizes. Partem dos mentores a integridade psicológica e o estímulo constante que irão atenuar as crises e revelar o que os subordinados têm de melhor para dar.
Segundo pesquisas recentes, 35% dos colaboradores importantes que não recebem 'mentoring' regularmente dizem que pretendem procurar emprego dentro de um ano. Na árdua missão de descobrir e reter talentos, o objetivo do mentor, entretanto, não é simplesmente o de propiciar o aprendizado, mas também o de promover melhor desempenho, produtividade e eficácia. Obviamente, há mérito em aprender por aprender. Mas no mundo atual dos negócios, em que imperam margens pequenas, deve-se aprender em nome de resultados.Por outro lado, o verdadeiro objetivo de 'mentoring' não é controlar. O controle implica fechamento, término, chegar a um destino. No mundo atual de constantes mudanças, a meta do mentor é dominar conhecimentos, uma jornada interminável e sempre expansiva de crescimento. Tal idéia sugere que o relacionamento, muitas vezes, é mais importante que a meta, e o processo costuma ser também mais valorizado que o próprio resultado. Neste contexto, a transferência de aprendizagem e a experiência são os poderes principais de contribuição que o profissional "sessentão" tem a seu favor, em meio a uma percepção geral equivocada de que lhe carece um papel nas companhias modernas.

Nenhum comentário: