sexta-feira, janeiro 07, 2011

Mortes em Araras poderiam ter sido evitadas

A tragédia que se abateu sobre uma família em que três crianças morreram por conta de uma barreira que destruiu uma casa na comunidade Mata Cavalo II, em Araras, na madrugada de terça-feira, poderia ter sido evitada se medidas concretas tivessem sido tomadas por parte do poder público para resolver problemas apontados há mais de cinco anos pelo geógrafo e chefe da Reserva Biológica de Araras, Ricardo Ganem.
“Aquela é notoriamente uma área de risco, por conta da instabilidade geológica do terreno, que está dentro de uma Área de Preservação Permanente (APP). Aquela encosta começou a ser ocupada no fim da década de 80 (1988) e é alvo de crescimento desordenado há anos. Posso garantir que a encosta em que aconteceu esta tragédia já foi alvo de procedimentos por parte do Ministério Público. Eu já avaliei aquela área há uns 5 ou 6 anos. Na ocasião, emitimos um laudo informando que a Comunidade Mata Cavalo II está em uma APP, inserida na APA-Petrópolis, que é supervisionada pelo Instituto Chico Mendes (ICMBIO). É um terreno com instabilidade geológica, onde existe risco iminente para os moradores”, assegura Ricardo Ganem.
O geógrafo lembra que na região de Araras outras três comunidades estão em situação semelhante: Poço dos Peixes, Mombaça e Vista Alegre. Segundo ele, são áreas onde a ocupação desordenada cresce, desrespeitando a legislação ambiental. Ganem frisa que o problema não se restringe às comunidades na região de Araras. Ele avalia que Petrópolis possui grande parcela de construções em áreas de APP, ou seja, terrenos com inclinação superior a 45 graus, topos de morro e margens de rio, em uma área que varia entre 10 e 30 metros. São terrenos que pelo artigo segundo do Código Florestal são considerados áreas de APP, onde a mata nativa deve ser preservada por força da lei. “Essas construções estão em praticamente todos os bairros do município. Do Quitandinha à Posse, verificamos que existem construções com estas características. É importante frisarmos que isso é o resultado de décadas de ausência de ações por parte do poder público. É o que tecnicamente chamamos de passivo acumulado”, pontua.
Ricardo Ganen explica que em áreas de APP deslizamentos ocorrem normalmente, devido a fatores geológicos, e frisa que as intervenções humanas potencializam o risco. “A retirada da cobertura vegetal deixa o solo, que já é empobrecido, ainda mais vulnerável. Tudo isso associado a construções irregulares, chuvas e ventos fortes, favorece os deslizamentos e soterramento de vítimas”, esclarece Ganem.
Na avaliação do geógrafo, somente ações integradas, de curto, médio e longo prazos, por parte do poder público, podem conter o crescimento desordenado em encostas, que ano após ano provoca mortes em Petrópolis. “É preciso que haja um trabalho de consciência socio-educativo, de engenharia e de fiscalização, concomitantes e permanentes”, afirma Ganem.
O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), por intermédio da 1ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva do Núcleo Petrópolis (Meio Ambiente), instaurou inquérito civil para apurar as condições que levaram ao desabamento da casa na Comunidade Mata Cavalo II, que resultou na morte da adolescente Suelen Cipriano Botelho, de 14 anos, e das meninas Lívia Dias Botelho e Jussara Botelho, ambas com oito anos.
“O MP vai investigar as causas do acidente e analisar as ações do poder público junto aos moradores em área de risco, para avaliar a necessidade de se ajuizar uma Ação Civil Pública. Estamos monitorando”, afirmou o promotor de Justiça Paulo Valim. A Defesa Civil de Petrópolis informou ontem que quatro casas no entorno do imóvel atingido pela barreira que vitimou as crianças foram interditadas devido ao perigo de novos deslizamentos. Os moradores destas casas foram aconselhados a deixar suas casas e procurar novas moradias.
Fonte: Tribuna de Petrópolis

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